Nas últimas semanas o Governo do Estado vem divulgando reformas em delegacias, compras de armas e viaturas, concurso para policiais, mas a realidade insiste em desmentir a propaganda. O diretor jurídico do sindicato dos policiais civis da Bahia e policial civil lotado em Itabuna, Mário Filho, mostrou qual é a real situação.
Mário Filho lembrou que a Bahia tem só 5.500 policiais civis, metade do indicado para seu tamanho, 11 mil. Além disso, cerca de 2 mil estão prestes a se aposentar e o atual concurso não terá como nomear ninguém neste ano.
Mário escancarou a realidade da Polícia Civil, que não tem nenhuma semelhança com a propaganda cor de rosa feita pelo governador Rui Costa. Metade dos municípios não têm sequer um delegado e não existe pessoal de limpeza. Os policiais têm que deixar de investigar para varrer chão e limpar banheiro.
A maioria das viaturas, incluindo as novas, está parada por falta de gasolina. A categoria não tem aumento há 8 anos, sofrendo uma perda de 54% no poder de compra. As delegacias estão cheias de mofo, os computadores são antigos e a internet é de baixíssima velocidade.
“A falta de uma boa internet impacta inclusive no dia a dia. Para ver uma imagem do videomonitoramento, precisamos ir até a central, porque não existe interligação com as delegacias”. Mário destaca que hoje todos os procedimentos são digitais, enviados para Salvador pela internet.
“Quando os policiais querem uma internet melhor, são obrigados a fazer uma vaquinha e pagar eles mesmos”, conta. Além da internet ruim, o local de trabalho é insalubre, com as paredes cobertas de fungos e mofo. “Mas o pior é que Rui Costa faz as coisas sem conversar com quem trabalha no setor”.
As reformas em delegacias, muito comentadas pelo governador, são apenas maquiagem. A do Complexo Policial de Itabuna, por exemplo, não inclui a instalação elétrica, que tem mais de 40 anos, nem outra coisa a não ser reboco e pintura. O mofo não é tirado, só escondido embaixo de uma mão de tinta.
“Quando ligamos o ar-condicionado, ele desliga o computador, porque a rede elétrica é precária há muitos anos”, relata o diretor do Sindipoc, que também é professor do estado. “Sofro com a falta de aumento duas vezes”, brincou na conversa com o jornalista Marcel Leal.
Mário conta que o Estado poderia ter resolvido tudo apenas com o que gastou na construção de uma nova delegacia, a da Deam em Salvador, mais de R$ 200 milhões. “Esse dinheiro seria suficiente para resolver os problemas de todas as delegacias do interior”, disse o diretor do Sindipoc.
A obra, por sinal, virou um “elefante branco”, porque tem heliporto mas esqueceram de fazer estacionamento. “Sem contar que a construção, idealizada pelo secretário de segurança anterior, foi cercada de denúncias. Foi um dinheiro mal gasto que poderia ter resolvido o interior”.
Marcel lembrou que a Bahia é recordista com mais de 6 mil homicídios por ano, enquanto São Paulo, com o triplo da população, tem quase a metade disso. Mário diz que esse número, ao contrário da propaganda, continua subindo, por falta de pessoal, de estrutura e de valorização dos policiais.
Ele também comentou sobre as dificuldades de fazer investigações. “Todos os vestígios que coletamos na cena do crime precisam ser enviadas para análise em Salvador e a resposta não chega com menos de três semanas, quando o crime já está frio”. Algumas análises têm que ser feitas em Minas Gerais.
Não por acaso, a Bahia soluciona menos de 20% dos crimes, o resto dos criminosos ficam impune por ausência de autoria nos inquéritos. “Nós precisamos de laboratórios no interior, melhores condições nas delegacias, pessoal para limpeza, reposição salarial, combustível, internet de alta velocidade e cursos de capacitação”.
Mário Filho também discutiu as audiências de custódia, os desvios de função, a diferença de armamentos para os bandidos, o novo cangaço, a necessidade de especialização em crimes digitais e online, polícia penal, entre outros assuntos.